Artigo

Conto de fadas atualizado

Era uma vez uma menina chamada Katrina. Ela morava em uma cidadezinha pacata e interiorana, onde as pessoas se divertiam usando drogas e fazendo festas de arrocha, na falta de algo mais edificante para fazer.

Katrina, dócil e meiga, era uma criatura servil dentro de casa, uma borralheira dos tempos modernos. Filha caçula, os seus pais, sujeitos carrascos e rudes, abusavam da criança frágil escravizando-a nos afazeres domésticos: passava montes de roupas, lavava outros tantos, cozinhava para toda família, faxinava todo o pequeno palacete e ainda era incumbida de fazer a feira da semana. Tudo isso porque falavam que ela nada colaborava em casa, não estudava, nem trabalhava fora.

Ela nunca tinha tempo para se cuidar, saborear uma boa refeição, pintar as unhas, depilar-se ou se vestir elegantemente, como seus irmãos. Aliás, o irmão e a irmã mais velhos tinham toda a atenção e todo o amor dos genitores. Estudavam em boas escolas, tinham as melhores vestimentas, usufruíam a vida sem dores maiores que não fossem instantaneamente solucionadas. Ela, Katrina, era a coitadinha relegada, o patinho feio.

Certo dia, cansada da existência triste e sofrida que tinha, fugiu para a cidade grande vizinha, que distava 18 quilômetros da sua. Começou a vender bala e rolete de cana nos sinais de trânsito e logo juntou um dinheirinho para poder estudar. Era o seu sonho, apesar de ser uma pessoa lenta no raciocínio. Queria estudar. Labutava de sol a sol todos os dias pensando em seu caderninho das Super-Poderosas, suas canetinhas da Hello Kit, sua borracha do Bob Esponja.

Assim fez. E quando chegou o seu primeiro dia de aula na escola noturna em que se matriculou, quase desmaiou ao ver adentrar em sala aquele que seria o homem mais bonito e mais inteligente que ela havia conhecido, o homem que seria o seu eterno príncipe encantado: o seu professor! Foi amor à primeira vista. E para os abismados ou conservadores, uma única resposta: o amor está ironicamente onde menos se espera!

A sua visão ficou turva, as suas mãos começaram a tremer. Ao ouvir o seu nome na chamada que o mestre fazia, não teve forças para responder de tão grande que era a sua fantasia, a sua paixão.

O docente, compadecendo-se da infeliz, perguntou se ela estava com fome, visto que aparentava estar fraquinha, magricela, não respondia. A calça e a blusa folgadas, obviamente emprestadas ou dadas por algum transeunte caridoso, destoavam do corpinho espetado, raquítico. Deu, então, uns trocados para ela ir à cantina fazer um lanchinho. Quando a pobrezinha chegou, o catedrático sorriu para ela, desejando-lhe melhor sorte. Não sabia ele que também estava ligado para sempre com aquela alma, lastimável alma!

Para encurtar a história, três anos depois, de tantos lanches, acarajés, tapiocas e caldos, o atarefado professor se apaixonou perdidamente pela pobrezinha e carregou aquele espírito ao léu para a sua humilde residência, fazendolhe sua esposa e dando-lhe uma vida mais digna, mais uniforme com a decência e a boa cristandade. Enfim, foram felizes para sempre. Ou não.