Artigo

Santificação dos condenados

Entre tantas particularidades nauseantes de sua vida politica, o Brasil tem um deputado-presidiário. É Natan Donadon, acusado de desviar R$ 8,4 milhões da Assembleia Legislativa de Rondônia, quando diretor financeiro. O Supremo condenou-o por peculato e formações de quadrilha.

O normal seria a cassação automática do mandato, como indica a Constituição. Mas o parlamentar foi salvo pelo fisiologismo do voto secreto, que a Câmara Federal ainda não trocou, nesses processos, pelo voto aberto. Ele próprio participou da sua absolvição e agradeceu de joelhos e mãos postas.

Indaga-se agora de haverá remake no caso dos deputados do mensalão recolhidos às grades. Pressionado pela opinião pública, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, se comprometeu a impedir votações enquanto perdurar o voto secreto.

Parece agora esquecido do que disse. Em vez de do cancelamento imediato dos mandatos de José Genoíno e outros presos em regime fechado (por enquanto), acaba de optar pela decisão do plenário. Justifica assim a suspeita de novo ato de santificação de prisioneiros.

Além de constituir hostilidade a um dos poderes da República, a dúbia conduta de Alves adensa a auréola de piedade de piedade tecida em volta de Genoíno. O ex-guerrilheiro está em vias de beatificação. Os companheiros de alto escalão, além de insuflar o MST a invadir mais fazendas e denegrir Joaquim Barbosa, por vingança, fazem de Genoíno um mártir.

Até a senhora presidente ou presidenta, que fazia bem em calar-se, entrou no coro dos penitentes, para transformar em arma eleitoral os tormentos hipertensivos do deputado. Até o ex-presidente, que de falastrão passara a múmia de faraó, ameaça falar.

Dizer o que? Repetir que de nada sabia, que o mensalão foi apenas caixa dois, que as elites espoliadoras conspiram contra os salvadores da pátria? A essa altura, insistir nesse teatro burlesco acentua a impressão generalizada de que faltam outros autores em Nuremberg – ou na Papuda.