Artigo

A terceira abolição

Osegundo império brasileiro foi operíodo político responsável pelo fim de uma mancha na Históriabrasileira. Foi neste período que um conjunto de leis marcou o fim da escravidão. Tivemos sucessivamente, o fim do tráfico negreiro, a lei do ventre livre, a lei dos sexagenários, e por último mas não menos importante: a abolição da escravatura, este texto não pretende discutir o processo jurídicode implantação destas leis pois vamos caminhar para umaabolição que ainda está por ser conquistada.

Recentemente, o Congresso Nacional aprovou a segunda abolição. Foi concedido direito de igualdade entre o trabalhador formal (aquele que tem carteira assinada e várias garantias sociais) e o trabalhador doméstico. Ampliandoinclusive o conceito de empregado doméstico, pois, piloto de aeronave que preste serviço a pessoa física e não a jurídica assume características de empregado doméstico. Mesmo na crista da onda não é desta abolição que pretendemos discorrer neste texto.

A escravidão que surgirá nestas linhas, é tão ou mais cruel do que as anteriores. Recentemente, a imprensa noticiou que o relatório DE OLHO NAS METAS 2012 constatou que menos de trinta por cento dos alunos do ensino médio conhecem o português de forma compatível ao nível exigido. O relatóriodo movimento Todos pela Educaçãodiscorresobre o aprendizado das línguas estrangeiras e mostra a realidade de salas superlotadas e uma carga horária ainda menor. Felizmente, o cenário não é de todo ruim. A terceira abolição já começou. E estatisticamente nossos filhos e netos já alcançam um nível de escolaridade superior ao nosso, e graças a Deus, já estão lendo mais. Desta forma, como no passado a abolição foi um processo lento, etapa por etapa. A terceira abolição deverá transcorrer na mesma forma. E coincidências à parte, Castro Alves – o poeta dos escravos – abolicionista autor de Navio Negreiro e Vozes d’África visionário como era, vislumbrou a abolição do terceiro milênio ao declamar: “Oh bendito que semeia livros, livros amão cheia e faz o povo pensar”.

Agora vamos falar dos grilhõesque escravizam o povo brasileiro: oiletramento. Chamamos de letramento no inglês literacy a capacidade de ler um texto simples (como um bilhete) e compreender o seu conteúdo. Boa parte da populaçãobrasileira inclusive a escolarizada está longe disto. O brasileiro, infelizmente, diz o que acha e não realmente o que está escrito. Além dele temos dificuldades nainterlecção vale o que já está escrito. E dificuldadenainterpretação (interpretar é detectaroque não está escrito; é buscar as informações implícitas do texto) nessas condiçõesa leituranão ocorre,impedindo o leitor de ir afundo no textoimpedindo-o de realizar inferências.

A completa incapacidade de entender o que lêcompromete tanto o emprego quanto a renda.

A empregabilidade fica seriamente abalada afetando também os concursistas (aqueles que buscam ingressar no serviço público), pois acessar o gabarito oficial de determinada prova, desanimaver queera incorreto o quesito que julgava certo. Os concurseiros, aqueles que já aprovados, ou até trabalhando no serviço público, almejam salários ou realizações maiores, são vitimadospor esta escravidão. Apenas para lembrar, e os exames de ordem como a tão temida prova da OAB onde apenas dez por cento dos inscritos logram êxito.

Mas como o iletramento afeta a renda? Quando falamos de renda vamos falar de trabalhabilidade, a capacidade de conseguir trabalho (não necessariamente um emprego), temos aqui o Brasil empreendedor, o Brasil do mercado informal, o Brasil dos consultores de produtos de beleza, dos famosos“vendedores de porta em porta” aqueles que direta ou indiretamente, movem a economia brasileira. Não precisamos falar de contabilidade, de balanço, balancete, razonete… nada disso, basta pegar as fichas onde estão registradosos produtos vendidos e seus respectivos preços, e se perguntar como alguém pode entender o que está escrito? Não sei se peço paciência. Não podemos esperar que esta abolição só alcance uma geração futura. Ela é para já. O cenário interno é favorável, há uma ascensão das classes C e D, inclusive com aumento do poder de compra. E o externo também, compomos o BRICS, a economia europeia e americana vislumbram o poder aquisitivo do brasileiro. Agora mais do que vontade política,basta que silencionsamente, a cada página virada de um livroem cada lar brasileiro, cada um alcance a plenitude da liberdade de entendero que se lê e afirmar a todo tempo: liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós…