Artigo

Alma gêmea

Por ambição, ousaram desafiar os deuses quando tentaram escalar o Olimpo. Os deuses reuniram-se, então, no conselho celeste, para deliberar sobre a sanção a ser imposta àqueles seres que pretendiam destronar a Zeus. Discutiram em exterminá- los. Mas, como fazê-lo sem que fosse em forma de sacrifício, homenagem ou adoração aos próprios deuses? Por outro lado, a insolência era intolerável. Aconselhado por Têmis, Zeus decidiu que os andróginos seriam divididos ao meio, separados.

Os andróginos eram criaturas redondas, suas costas e seus lados formavam um círculo que lhes dava fantástica mobilidade; possuíam quatro mãos, quatro pés e uma cabeça com duas faces exatamente iguais, cada uma olhando em uma direção, pousada num só pescoço, sendo que um lado era masculino e outro feminino, reunidos em um só ser, o homem e a mulher. Bastavam a si mesmos. Eram alegres e felizes. E a alegria era contagiante.

Separados, espalharam-se pelo mundo. De sorte que, cada metade passou a viver à procura da outra metade; quando se encontravam, voltavam a ser uma só pessoa. Daí, falar-se em cara-metade, em alma gêmea.

Quem neste mundo não procura ou não procurou por sua alma gêmea? E quantos já a encontraram? E quantos vivem nessa incessante busca?

Eu encontrei a minha! E foi nesse exato momento que nasci.

Casávamos todos os dias. Em todos os dias havia luar e eu via nos olhos dela, todos os dias, o amor que Deus guardou pra mim. Eu via no sorriso dela, o amor que Deus guardou pra mim. Eu não podia viver sem ela e ela sem mim não viveria. Éramos um só ser, uma só alma. Nossa felicidade era contagiante.

A nossa felicidade, o nosso amor e a nossa alegria incomodavam aos invejosos. Essa inveja, esse sentido mórbido, alimentado por calúnias, difamações e disse-me-disse, levaram o infortúnio a se abater sobre o nosso lar. Estávamos frágeis. Entre palavras tristes, chorava eu e chorava ela. Nos separamos. Ela foi numa direção e eu outro rumo segui. Eu não conseguia viver sem o amor dela. Sem ela, vivia por viver.

Certo dia nos reencontramos. Olhando nos olhos dela e ela olhando nos meus, sentimos que o nosso amor não havia se perdido. E foi aquele abraço carinhoso, aquele cheiro cheiroso, aquele beijo gostoso e a percepção de ser o mundo tão pequeno para o nosso grande amor.

Amo você!

<i>Nota da Redação: Na edição nº 84 (dezembro/ 2015) por um erro da redação a Crônica saiu trocada. Eis a correta.</i>