Artigo

O desprezo…

O desprezo é um amontoado de emoções conturbadas. Na sua “composição básica”, no entanto, dois sentimentos se destacam e se embaralham: a raiva e a angústia. A pessoa que despreza sempre revela o que há de mais negativo sobre a pessoa desprezada, e expressa uma grande raiva ao salientar essa negatividade. Quem despreza, também é incapaz de ressaltar algo de bom da convivência e da afetividade em relação ao ente desprezado, e isso gera também uma grande angústia interior (quase inexprimível) que por sua vez realimenta a raiva. Por vezes coisas ruins acontecem em nossas vidas.

Nesses momentos, a decepção ou as dores (físicas e/ou emocionais) decorrentes daqueles episódios, podem nos entristecer profundamente, obstruindo-nos a esperança. E às vezes (muitas vezes) culpamos os outros por essas infelicidades. E muitas vezes também, a pessoa “culpada” nem sabe do que é “culpada” e nem entende a razão de ser responsabilizada por isso.

Quando essa atribuição de culpa chega ao seu ápice, muitas vezes, simultaneamente, o desprezo vem à tona, enfurecido ou silencioso. Em ambos o casos isso é muito perigoso. Desprezar faz muito mal à saúde psíquica. E tem mais ainda: pode ser um passo expressivo rumo à depressão, o que é algo também muitíssimo perigoso. Ser desprezado, por sua vez, é uma das formas mais cruéis de sofrimento. E quando o desprezo parte de alguém que amamos (isso ocorre com mais frequência do que supomos) a crueldade torna-se uma tragédia. Perdemos os sentidos quando isso acontece. Sofrer o desamor da pessoa amada é um sentimento quase inominável. Para piorar o desprezo quase nunca anda só, e, comumente, vem acompanhado de agressões verbais e acusações psicoemocionais. As palavras carregadas de desprezo, quando desferidas, são tão impactantes quanto sucessivos socos na cabeça, ou pior: na alma! O estrago é devastador.

Os danos podem ser irreparáveis. As marcas psicoemocionais podem nunca mais se fechar. Quando perdemos a capacidade de nos colocar no lugar do outro e ignoramos suas tristezas e alegrias, derrotas e vitórias, realizações e expectativas e não nos importamos com esse “outro”, nos aproximamos da insanidade e da apatia quase absolutas. Nesse momento, acentua-se uma combinação explosiva de sentimentos (notadamente a raiva e a angústia) que podem nos conduzir, perigosamente, à intolerância e ao radicalismo. Um bom relacionamento requer bom senso, bom humor, harmonia e amor. Não vale a pena viver sem amor. Nada vale a pena sem amor. Afinal, não é o tempo que passa, somos nós que passamos pelo tempo. E temos pouco tempo para viver… Quando a morte vier e reduzir tudo à pó, então será tarde demais pra dizer que gostaria de ter tido outra chance para fazer diferente (fazer melhor). A cumplicidade amorosa, aquela que se preocupa e cuida e se importa, deve ser o primeiro grande laço afetivo de nossas vidas. E deveria mesmo nos fortalecer, mutuamente, ao longo dessa nossa jornada. Não dá para amar sozinho. Ninguém é alto suficiente. Ninguém sabe tudo. Ninguém é melhor que ninguém. E quando ouvimos da pessoa amada, palavras cruéis, grosseiras, estúpidas; ou quando nos deparamos com aquele silêncio tão cruel, grosseiro e estúpido quanto àquelas palavras ferinas, porque esse silêncio está cheio de desprezo, então percebemos que a pessoa amada não se importa com o que sentimos e isso também nos fere de quase-morte.

Se o amor pode doer, o desprezo dói muito, muito mais. O desprezo é maligno. Porém há maneiras de se combater a sua malignidade, por exemplo: permita que o amor seja sempre o primeiro sentimento nos guiar; consinta que esse mesmo amor revele-nos a fragilidade da vida.).