Entrevista

Entrevista com o presidente do Conselho Nacional da Ordem do Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coêlho.

Marcus Vinicius – Um ano se passou desde quando o senhor assumiu a presidência da OAB. Qual é sua avaliação sobre esta experiência?
Marcus Vinicius – A OAB possui duas missões, duas funções. Estas missões são fixadas por lei, na Lei Federal, que criou o estatuto da advocacia, como também na própria Constituição e nos frutos da própria entidade. Uma missão é a corporativa: selecionar os advogados, disciplinar a conduta, verificar a ética na condução dos profissionais da advocacia, no exercício de suas atividades, lutar pela valorização da advocacia, defender os direitos e garantias do exercício profissional, das prerrogativas do exercício profissional do advogado. Um advogado valorizado significa um cidadão respeitado.

– Por quê?
Marcus Vinicius – Este é um dos lemas desta gestão. Porque temos de um lado o Estado julgador, o Estado acusador, o Estado que cobra impostos, o Estado que interfere na vida das pessoas. Por outro lado temos as pessoas físicas e jurídicas. Pessoas que têm a seu favor o advogado quando são agredidas em seus direitos e em suas garantias. Se o advogado é enfraquecido, a pessoa jurídica e física é fragilizada perante o Estado. Para que esta balança não se desequilibre e o cidadão seja respeitado, o profissional do cidadão, que é o advogado, precisa ser valorizado. Por isso há um dispositivo que precisa ser anunciado, que é o artigo 6º da Lei Federal 8.906, o Estatuto da Advocacia, que diz que não há hierarquia entre advogado e juiz, não há hierarquia entre advogado e membro do Ministério Público, não há hierarquia entre advogado e qualquer servidor público. Por quê? Não deve haver hierarquia entre o cidadão e o Estado. O Estado deve ter como finalidade assegurar os direitos do cidadão e deve respeitá-lo. Portanto, esta luta pela valorização do advogado é em favor do cidadão. Esta é uma das missões da Ordem, que é cuidar da corporação.

– Qual é a segunda missão?
Marcus Vinicius – Cuidar das causas da República. Este é o segundo lema da atual gestão. É a OAB como a voz constitucional da sociedade brasileira. A Constituição Federal, que cita e menciona a Ordem dos Advogados do Brasil em oito oportunidades, atribui à OAB esta função ao dizer que a nossa entidade possui legitimidade ativa, ou seja, a possibilidade de ingressar em juízo na defesa de causas da cidadania. Isso faz com que a Ordem possa propor ação direta de inconstitucionalidade contra leis e normas inconstitucionais, arguição de descumprimento de preceito fundamental, ação declaratória de inconstitucionalidade. A Ordem tem assento no Conselho Nacional de Justiça, no Conselho Nacional do Ministério Público. Ela participa do concurso de seleção dos juízes membros do Ministério Público e de advogados públicos. Ao assegurar essas prerrogativas à Ordem dos Advogados do Brasil e ao dizer que o advogado é inviolável no exercício da profissão, a Constituição deixa claro que a Ordem tem a obrigação de ser porta-voz da sociedade brasileira, na defesa da ordem constitucional, da norma constitucional.

– E como foram colocadas em prática estas missões em 2013?
Marcus Vinicius – Neste ano, durante a defesa destas causas da República, concluímos o julgamento da ação de inconstitucionalidade da PEC do calote dos precatórios. Foi uma vitória alcançada no primeiro semestre deste ano. O Supremo Tribunal Federal disse que o cidadão que teve na Justiça assegurado seu direito, não pode ficar 15 anos esperando pelo pagamento, como esta PEC do calote dos precatórios previa. Ingressamos no Supremo Tribunal Federal com uma ação declaratória de omissão, em que o Supremo nos deu uma liminar. Isto foi feito para obrigar o Congresso Nacional a editar uma lei de proteção aos usuários dos serviços públicos. Nós não a temos no Brasil. Temos o Código de Defesa do Consumidor, mas não temos o Código de Defesa do Cidadão que precisa da escola, do hospital para seu tratamento.

– E o que mais?
Marcus Vinicius – Lutamos também, ao longo deste ano, por um ensino de Direito de qualidade. Fizemos um pacto com o MEC que congelou a criação de novas faculdades de Direito e, junto com a OAB, estamos elaborando um novo curso de Direito para o Brasil, um novo marco regulatório. Isto é a Ordem se preocupando com o futuro do mundo jurídico brasileiro. Lançamos também uma importante luta pela reforma política do Brasil. Entendemos que esta é a reforma das reformas, uma reforma que modificará a forma com que são eleitos os representantes do povo. Não como uma simples mudança do sistema eleitoral, mas uma reforma política profunda em que a votação seja em ideias, propostas, com financiamentos democráticos de campanhas, para que assim o eleitor saiba quem ele está elegendo ao votar. Hoje ele não sabe. Hoje existe uma linha oculta. Estamos, portanto, cuidando da valorização da profissão e das causas da República.

– A voz da Ordem tem sido devidamente ouvida pelos poderes do Brasil?
Marcus Vinicius – Sim. É preciso ser justo no sentido de que os poderes constituídos, não apenas o Congresso Nacional, que é o poder em que todas as vertentes da sociedade estão representadas, mas o Judiciário, principalmente, como também a própria presidência da República têm ouvido a Ordem, têm dado a devida deferência à importância institucional da entidade. Vide quando a presidente nos convidou para discutir saídas para a crise política em que o Brasil se envolveu neste ano, a partir das manifestações. A OAB foi a primeira entidade nacional a se encontrar com a presidente da República, logo no dia seguinte das manifestações.

– E como foi?
Marcus Vinicius – Primeiro ela se reuniu com os governadores e depois com a Ordem. Ela ouviu as sugestões da Ordem e inclusive tinha a ideia da convocação de uma Constituinte. A Ordem entendeu que, se por um lado uma reforma política é importante, por outro lado uma Constituinte naquele momento não seria a melhor medida. A presidente acolheu nossa reflexão. Então, sendo justo, não posso deixar de reconhecer que os poderes constituídos no Brasil têm permitido o devido diálogo com a Ordem dos Advogados do Brasil.

Fonte: Revista Brasília em Dia.