Artigo

Animais humanos e não-humanos e os maus tratos

No jornal A Tarde, edição de terça-feira, dia 24-6-2008, p. 3, li o artigo da gerontóloga e assistente social Marta Lopes Pontes Caldas, intitulado “Violência contra o Idoso”. Ali, a especializada articulista indica as principais vítimas da violência: mulher, criança e idoso, traçando a realidade agressiva à qual é submetida essa frágil tríade, e clamando pormelhorias institucionais em prol dos da terceira idade, que em 2025 farão do Brasil o sexto país mais velho do planeta com cerca de 32 milhões de pessoas com mais de 60 anos.

Todavia, essa violência, que se caracteriza por abominável expressão da covardia humana (já que há a dominação agressiva do mais forte sobre o mais fraco e auto-indefensável) é, diariamente, cometida pelas pessoas, também contra os animais, sejam cães, gatos, cavalos, aves e outros.

E são agressões terríveis, chocantes, mas que infelizmente ainda não despertaram na consciência da população (que tem receio de denunciar maus tratos praticados por vizinhos, parentes ou amigos) e dos governantes responsáveis pela institucionalização dos instrumentos públicos de prevenção (educativos) e os de punição (corretivos e repressivos), a importância de combatê-las energicamente, apesar de estar claro no texto da Constituição Federal que é vedada a prática de crueldade contra os animais; de serem os maus tratos tipificados como crime (Lei 9.605, de 12-2-1998), com a especificação das formas definidas no Decreto Federal n. 24.645, de 10-7-1934; e de ser hoje esse direito tutelado pelo Ministério Público (Promotorias do Meio Ambiente) e por Juizados Especiais Criminais competentes para processar os criminosos agressores de animais.

A sociedade precisa acordar para essa realidade. Animal é extremamente maltratado, por ricos e pobres, ignorantes e esclarecidos. Até por doutores.

Em importante estudo realizado por Antonio Carlos Fernandes, advogado baiano e pós-graduando em psicopedagogia social, os agressores que investem contra crianças, mulheres e idosos começam agredindo animais. Segundo ensina, os serial killers (aqueles que matam em série) iniciam sua jornada criminosa estrangulando pássaros, queimando gatos, estuprando cadelas, como foi o caso do maníaco do parque. Fernandes expõe que nos Estados Unidos, quando uma criança, ou adolescente, é flagrada maltratando animais, passa a ser observada e acompanhada pelo FBI americano, por demonstrar uma personalidade patológica geradora de violência subseqüente contra pessoas.

A violência contra animais aqui no Brasil ainda é encarada de forma tão natural, que em muitos casos os agressores nem mesmo se incomodam em disfarçar a sua estupidez. Praticam-na às escâncaras e freqüentemente se regozijam da tortura que fizeram. Um empresário conhecido em Salvador, do ramo de educação superior (pasmem!), contou, numa roda de amigos, esbanjando gabolice, que, para se livrar do “incômodo” que lhe causava seu próprio cachorro de estimação, quando tomava umas cervejas no final de semana, ligou a mangueira do jardim e enfiou-a no ouvido do pobre animal. Diplomado, rico de dinheiro, mas paupérrimo de bondade, de sentido de humanidade e sensatez. É um criminoso. Certamente que a lei do retorno fa-lo-á, adiante, em algum momento, vítima de perversidade proporcional ao sofrimento imposto ao cão, que deveria, ao contrário, proteger.

São Francisco, Leonardo da Vinci, Peter Singer, Paul McCartney, Brigitte Bardot e outras almas viventes ou desencarnadas, de reluzente energia amorosa e piedosa para com os mais fracos, haverão de inspirar a nossa sociedade para reconhecer nos animais seres sencientes, que “só não falam português”, mas expressam a sua honestidade, solidariedade e outras qualidades invejáveis aos “racionais” em todos os momentos da vida, até quando olham indefesos as atrocidades praticadas pelas pessoas insensíveis, infinitamente inferiores se comparadas a essas nobres criaturas.