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A aplicabilidade dos direitos fundamentais (Parte Final)

As normas constitucionais de eficácia contida incidem, imediatamente, sem a necessidade de ulterior integração legislativa, prevendo, contudo, meios ou conceitos que possibilitam manter sua eficácia contida em certos limites. Nesse sentido, as normas constitucionais de eficácia contida são aquelas normas constitucionais de aplicabilidade direta, imediata, mas não integral, porque estão sujeitas a restrições previstas ou dependentes de regulamentação que limite sua eficácia e aplicabilidade, como se verifica, por exemplo, da leitura do art. 5º, XIII.

As normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida demandam a intervenção legislativa para incidirem, porque o poder constituinte não lhes emprestou normatividade jurídica suficiente para isso pelo que sua aplicabilidade é indireta, mediata e reduzida.

As normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida podem ser subdivididas em normas de princípio institutivo, que se propõem a estruturar organismos ou entidades (por exemplo, art. 18, parágrafo segundo), e normas de princípio programático, que veiculam políticas públicas ou programas de governo, que apontam para a realização dos fins sociais do Estado, como, por exemplo, os arts. 196 e 205 da Constituição Federal de 1988.

A classificação proposta por José Afonso da Silva pode ser, no entanto, criticada, pois, ao lume do postulado hermenêutico da máxima efetividade dos direitos fundamentais da Constituição, todas as normas constitucionais podem ser diretamente aplicadas pela via jurisdicional, pelo que deve o magistrado aplicar diretamente mesmo uma norma de eficácia limitada, desde que se configure a situação correspondente à prescrição normativa.

Não é outro o entendimento vanguardista de Dirley da Cunha Júnior[3], para quem, partindo-se da constatação de que a Constituição vincula tanto os órgãos estatais com os cidadãos, dúvidas não podem mais subsistir quanto à natureza jurídica e imperativa das normas de eficácia limitada, como as ditas normas programáticas.

Nesse sentido, as normas programáticas, sobretudo as atributivas de direitos sociais e econômicos, devem ser entendidas como diretamente aplicáveis e imediatamente vinculantes de todos os órgãos dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

Decerto, são tão jurídicas e vinculativas as normas programáticas, malgrado sua abertura ou indeterminabilidade, que, na hipótese de não realização destas normas e destes direitos por inércia dos órgãos de direção política (Executivo e Legislativo), caracterizada estará a inconstitucionalidade por omissão.

Todas as normas constitucionais concernentes à estrutura axiológica e teleológica dos direitos fundamentais –inclusive as ditas programáticas – geram imediatamente direitos subjetivos para os cidadãos, inobstante apresentem graus eficaz distintos. Sendo assim, considerar as normas constitucionais programáticas como meras proclamações de cunho ideológico ou político implica negar a existência delas como categorias normativas.

O Estado Constitucional pós-moderno está submetido ao ideal de uma Democracia substantiva ou material, pelo que as eventuais inércias do Poder Legislativo e do Poder Executivo devem ser supridas pela atuação do Poder Judiciário, mediante mecanismos jurídicos previstos pela própria Constituição (por exemplo, o mandado de injunção, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão e a argüição de descumprimento de preceito fundamental).

Deste modo, a realização da eficácia das normas constitucionais exige o fortalecimento de uma jurisdição constitucional emancipatória e progressista, assumindo o Poder Judiciário um papel fundamental no Estado Democrático de Direito, através de uma hermenêutica criativa e concretizante da essência axiológica e teleológica de uma Constituição, indispensável para a materialização de um direito justo.

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[1] LARENZ, Karl. Derecho Justo – Fundamentos de Ética Jurídica. Madrid: Civitas, 1993, p. 21.
[2] SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 88.
[3] CUNHA JÚNIOR Dirley da. Controle judicial das omissões do poder público. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 101.