Artigo

Mudança de Hábito

Voltando a Ilhéus, não mais para rever parentes e amigos, mas para ficar, tive a estranha sensação de que algo havia mudado. Afinal, o fato de estar em contato com as minhas origens sempre me fez sentir a sensação de estar em casa. Não era uma realidade virtual, nem uma ilusão de ótica e sim a mais simples realidade. Então, porque estranhar esta realidade?

Dizem que a verdade muitas vezes dói, mas, sou daqueles que ainda preferem encarar os fatos a fugir pela tangente, mesmo porque, às vezes em que escolhi a opção fugir, foi desastroso tanto para mim como para os que bem me queriam.

Andando pelas ruas e avenidas da cidade, observei que a paisagem continua a mesma, sempre bela, encantando a todos os que a visitam.

Caminhos de sol, porto seguro para tantas pessoas que resolvem aqui se refugiar. Encontro com os amigos numa esquina ou numa mesa de bar e conversamos “abobrinhas” deixando o tempo passar. Estas conversas, bate-papos informais, sempre atraem outros tantos amigos, que entram e saem da roda como numa brincadeira de criança, sem nenhuma obrigação.

Nestes encontros informais sempre aparece alguns saudosistas relembrando o passado, comentando como era bom isso ou aquilo.

Talvez esteja aí a minha estranha sensação. Já diz um velho ditado popular que quem vive de passado é museu. Teria sido muito bonito se pudéssemos ter congelado a Gabriela em cima do telhado. Poderíamos pelo menos, admirar constantemente não só a beleza, mas também, a coragem de uma pessoa, ou melhor, de uma mulher que não se contentou com a fartura que os coronéis lhe ofereciam, transgredindo regras, tradições e costumes que não faziam sentido algum para quem desde menina aprendeu a ser autêntica e livre.

Afinal de contas mudou a cidade ou mudamos nós? Consideramos as duas hipóteses. O mundo está mudando e não é só uma questão política ou geográfica. E nós, antes de qualquer coisa, somos seres vivos em constante evolução. A era dos coronéis passou, a tão anunciada era de aquário, ainda não chegou, então, vamos nos debruçar na janela para ver o tempo passar?

Tenho de admitir que seja tentador ficar criticando isto ou aquilo, numa atitude passiva, esperando que as coisas aconteçam. Difícil é sair da gaiola e buscar o alimento com as próprias mãos.

Não aprendi a caminhar sozinho e continuo sentindo falta de parceiros neste mundão de meu Deus. Ah!

Se todos aprendessem a voar, descobririam o quanto a vista do alto é mais bonita, talvez até ficasse insuportável, milhões de aeronaves num congestionamento interplanetário ou apenas como nos atuais engarrafamentos, carros presos em sinaleiras ou submetidos a um rodízio para evitar também a poluição. Como diria Fernão Capelo Gaivota, é muito triste viver só para pescar o peixe do almoço e transformar as sobras no jantar. A natureza nos impõe desafios que precisamos crescer para transpassar. Se não houvesse terras férteis por aqui, não haveria disputas por um pedacinho de chão. Nem poderíamos chegar a sentir o sabor da vitória de conquistar um lugar ao sol.

Outro dia, li um artigo de uma amiga, pessoa que admiro por sua garra e determinação, que perguntava pela antiga coragem dos Tavare’s e dos Badaró’s. Acrescento que já não vivemos numa região manipulada pelos coronéis do cacau. Estamos no tempo onde todos precisam aprender a dançar, cantar e, se possível, até sapatear na roda da vida.

Crises sempre existiram e sempre existirão, pois são nelas onde encontramos as soluções para acompanhar a mudança dos ventos, a quebra da rotina. No Brasil nós já passamos pelo ciclo do pau-brasil, pelo da cana-de-açúcar, pelo do café e estamos terminando o ciclo do cacau para começarmos um novo ciclo. Quem já encontrou a saída, por favor, avise, pois tem um monte de gente procurando.

Se sua mente pegar fogo, não desanime, pois a “Phoenix” renasceu das cinzas.

Ainda bem que não estamos mais sob um regime de ditadura e posso ter a liberdade e a atitude de escrever estas linhas e gritar para o mundo como um despertador agitado, com sede, com fome, com vontade de aprender mais. Acordem a Maria bonita, o João e o José, sem esquecer-se da vizinhança, de “nóis” caipiras e dos coronéis. Acorda minha cidade natal, pois o sol já nasceu, perdemos o espetáculo, mas amanhã de madrugada haverá uma nova sessão.