Artigo

A ignorância de Júlio

“Eu não entendo tanto de cinema”
se desculpa.
“Não tem importância, querida
Não cobro fiança.”

“Gosto da Argentina, contudo”
se redime
“Por causa de Maradona?”
aperto
“Não exatamente.
Menos por ele que pelo espírito
platino”
se desafoga
antes de jogar a bomba
“Mas também por causa de Julio.”
“Grondona?”
fico com medo
“Não, Cortázar”

“Isso merece um brinde”
ainda incrédulo
“À Argentina de Cortázar
parisiense
e a Michelangelo
Em Londres”

se espinha
feliz
“O mundo seria melhor
se toda mulher que não entendesse tanto
de cinema
lesse Cortázar”
ganho em euforia

“E”, bebe
compulsivamente, antes de completar
“E, como ia dizendo O mundo seria melhor
se todo e qualquer
imbecil
percebesse quantos gênios
ou quase isso
nossos vizinhos já fizeram”
declama em praça pública
da cama própria
“Ah, se fosse sempre assim
a ignorância cinematográfica…”

Salvador e Itabuna, fevereiro de 2010

Beijo
As Babas do Diabo, conto de Julio
Cortázar, é uma maluquice sem tamanho
– e muito talento. Como é a adaptação,
completamente infiel, de Michelangelo
Antonioni: Blow Up – Depois Daquele Beijo (1966). Uma partida de tênis nunca mais será a mesma…

Argentina
Já que o texto está quase uma
ode à Argentina, além de Cortázar,
da literatura, bom frisar que
não falta gente boa no cinema dos
nossos estimados vizinhos. De Pablo
Trapero e sua Família Rodante
(2004) a Lucrecia Martel e sua
Menina Santa (2004). Isso para
não falar no mais acessível, especialmente se comparado a Martel,
O Filho da Noiva (2001), de Juan
José Campanella. Por favor, eles
também são bons.