Artigo

O Centenário de Itabuna

O Centenário de Itabuna não pode ficar à mercê de intrigas políticas, nem mesquinharias administrativas. É pertinente que estejamos atentos para o fato de que uma data tão importante quanto o Centenário da nossa Cidade, não se torne “prisioneira” daqueles que, por ventura, acham-se “donos” dela.

Temos que afastar as diferenças, para pensarmos com inteligência! Sim, claro que eu reconheço que essa data magna representa uma oportunidade óbvia para ganhos políticos. Sei onde vivemos e historicamente, tanto a nível nacional, estadual, quanto a nível municipal, vimos apropriações grosseiras da nossa história que, sinceramente, envergonham todos aqueles que possuem um mínimo de bom senso. Se alguns ainda não sabem, vivemos no século XXI! Lutamos, choramos, sofremos e até perdemos vidas para conquistarmos nossos legítimos direitos sociais. Os “coronéis”, por exemplo, e suas arrogâncias políticas, são memórias de um tempo que contam parte da nossa história, mas, já não fazem sentido neste nosso consolidado ambiente democrático.

As comemorações pela emancipação político-administrativa de Itabuna remetem-nos à construção de “novos mitos”: boa parte da imprensa local e os famigerados discursos de gabinete insistem em referências àquele passado afortunado do cacau que em verdade ocultaram e ocultam mazelas sociais que nos circundaram e ainda hoje nos circundam. Claro que o cacau e as riquezas proporcionadas por ele ergueram aqui na região (e, óbvio, em Itabuna) uma percepção de sociedade que, no imaginário, no senso-comum, sempre foi “desbravadora”, “próspera”, “triunfalista” e até “civilizadora”! No entanto, ainda hoje, como também naquele passado, muitos itabunenses viveram/vivem marginalizados, excluídos e desassistidos.

Para Marc Ferro, historiador francês, pertencente à 3ª geração da Escola dos Annales, “hoje, mais do que nunca, a história é uma disputa… E controlar o passado sempre ajudou a dominar o presente”. Para Ferro, portanto, quanto maior fosse a propagação do conhecimento, maiores seriam os controles sobre a produção histórica. Controle este derivado do Estado e de seus organismos, dificultando, daquele modo, “qualquer análise que possa revelar suas interdições, seus lapsos, que possa comprometer a imagem que uma sociedade pretende dar de si mesma”.

O Centenário de Itabuna precisa ser visto também de maneira crítica. A nossa história não foi feita unicamente por aqueles que hoje dão nome às ruas, às praças e aos edifícios mais imponentes. Itabuna precisa ir muito mais além do que a história dos “desbravadores”. Precisa ultrapassar os limites da idéia generalizada de uma sociedade homogênea que deu oportunidades iguais para todos. Não existe sociedade sem contradições. E, portanto, não há porque, especialmente agora no Centenário, fazermos de conta de que as luzes dos fogos de artifícios não são artificiais! Por fim, mais uma vez recorro ao mestre poeta itabunense, Telmo Padilha. Certa vez em uma de suas crônicas, Padilha, imaginou como teria sido a administração de Graciliano Ramos, o autor de Vidas Secas, São Bernardo, Caetés, e outros, frente à prefeitura de Quebrângulo, hoje Palmeira dos Índios, em Alagoas (Graciliano foi prefeito daquela pequena cidade). Assim Padilha escreveu, profeticamente: “uma cidade (Quebrângulo) não muito diferente de Itabuna, carente das mesmas coisas, sem nenhuma opção cultural (…). Vejo os políticos preocupados em trepar na vida indiferentes às comezinhas necessidades espirituais do povo… Vejo empresários cuidando apenas dos seus interesses, acumulando fortunas e indo gastá-las em outros lugares…”

O Centenário não pode se resumir às fotos oficiais com políticos de sorrisos amarelos, aproveitadores e oportunistas!