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Crime sexual cometido contra menor à luz do aspecto jurídico e sociológico

Crimes sexuais são condutas ilícitas revestidas de atos libidinosos praticados por pessoas capazes juridicamente de entender a ilicitude e a tipicidade do fato.

Uma vez feita a definição do que seja crime sexual, importa ressaltar que quando cometido contra menores, a repressão é maior e o legislador parece se esquivar do contexto social e moral, necessários à justa aplicação da pena ao infrator.

Como se não bastasse, a reforma do Código Penal Brasileiro no que tange aos crimes sexuais é medíocre e obsoleta, o que demonstra uma involução do legislador, que indubitavelmente traz conseqüências danosas na esfera social. Senão vejamos:
Antes da reforma do Código Penal gerada pela lei 12.015/09 o abuso sexual em face de menores de catorze anos estava previsto no Art. 213 associado ao Art. 224.

Era, pois, considerado estupro comum com presunção de violência.Mas qual a natureza da presunção, relativa ou absoluta?

A dúvida é dirimida com a redação do Art.213 que define o estupro comum: ”constranger mulher à conjunção carnal mediante violência ou grave ameaça”. Logo, inexistentes os pressupostos do tipo penal, inocentava-se o acusado, considerando a presunção “júris tantum”.

Ao admitir prova em contrário, o legislador mostrou-se flexível. A contrario sensu, com a reforma, o legislador cuja competência é legislar passa a condenar o infrator antes mesmo de promulgada a sentença, violando o principio da presunção de inocência elevado à categoria de direito fundamental, previsto no Art.5º inciso LVII. Desta forma, retira-se do acusado o direito à defesa e ao contraditório, garantias constitucionais.

Doravante, sendo o sujeito passivo menor de catorze anos, não há que se falar em estupro comum e sim estupro de vulnerável, considerando para todos os efeitos legais a incidência do menor no que concerne aos atos sexuais, o que na atual conjectura é questionável, pois se o menor de catorze anos pode responder por atos infracionais segundo o ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, por que razão não tem o mesmo discernimento sobre os atos sexuais?

É uma dicotomia que deve ser sanada, pois ao considerar o menor vulnerável e inócuo no tocante aos atos sexuais, esquece o legislador que o Direito contempla as mudanças sociais, de modo que uma lei criada em 1940 não serve a uma geração do século XXI, posto que a norma deve acompanhar os avanços sociais. O legislador negligencia estes avanços, ao prever para configuração do estupro comum o emprego de violência ou grave ameaça, enquanto o estupro de vulnerável prescinde dessas elementares, o que o torna menos gravoso, embora o legislador tenha aplicado pena superior para este último. Portanto, é notória a desproporcionalidade da pena.

Com efeito, ao vislumbrar a lei penal fora do contexto social em que a norma deve estar inserida o legislador retroage ao direito kelseniano e positivista, considerando apenas a fria e objetiva letra da lei, quando na verdade, deveria atentar para os valores morais, sociais e culturais, indispensáveis à digna aplicação da norma. Aos julgadores, compete, ante o exposto, aplicar a norma ao caso concreto, analisando as circunstancias a depender do grau de maturidade e desenvolvimento de cada adolescente, uma vez que idade biológica difere de idade mental, o que pode ser sintetizado no entendimento transmitido pelo ilustre professor Luiz Flávio Gomes (2001, p.144): “Enquanto se trata de criança há a innocentia consilli. Cuidando-se de adolescente, cada caso é um caso. Pode haver violência real, mas também pode haver consentimento válido. Tudo depende do caso concreto.”

Entender de forma diversa, significa ceifar a liberdade sexual daquele que embora não esteja na idade legal para a prática dos atos sexuais, encontra-se com discernimento e maturidade suficientes para usar do seu livre arbítrio tão engessado pelo Estado no tocante à autonomia sexual.