Artigo

Entre São Paulo e São José, Itabuna adormece

Em São Paulo, há um dito popular que compara a Avenida Paulista, principal artéria do coração daquela cidade, com o cotidiano de um casamento, pois ambos começam no Paraíso (bairro) e terminam na Consolação (rua e cemitério).

Como um bom baiano, eu prefiro pedir emprestado alguns versos e parafraseando Caetano Veloso, digo que alguma coisa acontece no meu coração, que só quando cruza a Paulista com a Consolação. Rendo também minha homenagem ao tentar novamente transformar em palavras, um sentimento quase que indescritível.

Um alpinista que consegue chegar ao cume da montanha deve desfrutar de algo parecido, pois ao tempo que nos sentimos grandes, poderosos e com um gosto suado de vitória, também nos damos conta do quanto ainda somos pequenos, diante da imensidão do universo.

Transitando pela frente da residência onde outrora morava a família Matarazzo, antigos barões do café ou bisbilhotando a feira de antiguidades sob o vão do MASP, não dá para esquecer, nem deixar de ser um “papa jaca”, um “papa caranguejo”, ou, melhor dizendo de uma maneira politicamente correta, um grapiúna aos pés de arranha céus infinitos.

Para quem ainda não teve o prazer de conhecer o MASP, o Museu de Arte de São Paulo é o sonho realizado de Assis Chateaubriand, da arquiteta Lina Bo Bardi e de artistas, como Tarsila do Amaral, Oswald e Mário de Andrade, Di Cavalcanti, dentre outros, que um dia se empenharam em promover uma semana de arte moderna, revolucionando o país.

Sem pedir licença ao Roberto ou aos “jovens guardas”, entro na Rua Augusta a 80 por hora, só que dessa vez, a pé, aliás, de tênis, para não perder o “Cooper” (se é que alguém ainda se recorda da origem ou do significado desta expressão!), e, correndo até o Parque Ibirapuera, encontro uma nova multidão de formigas paulistanas, já sem os ternos da referida Avenida.

Encontro também as mais variadas atividades esportivas, além de cultura e muito lazer. Praticamente tudo que um pacato cidadão poderia almejar, ainda com direito a sanitários e bebedouros gratuitos espalhados pelo parque, sem esquecer também de mencionar a segurança, manutenção e limpeza diária, sempre aos nossos olhos.

Meio atordoado e com o coração na mão, dou de cara com o Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, hospital público, dirigido pela Fundação Adib Jatene, onde sou atendido sem custo e sem discriminação, com direito a instalações, equipamentos e equipe de médicos de tirar o chapéu em qualquer lugar de primeiro mundo. Seria tudo isso um sonho ou um devaneio? Ou a vontade de ter atendido nossos anseios de uma vida com dignidade e bem estar social, tenha tapado os meus olhos para a violência, para os engarrafamentos ou tantos outros problemas cotidianos de um grande centro urbano?

Eu lhes afirmo que não. Tanto a cidade de São Paulo como a nossa querida Itabuna figuram entre as primeiras do país em violência urbana. Lá, ao entrar em um táxi para me dirigir ao Aeroporto, o motorista me confidenciou que acabara de ser “assaltado” por um suposto cliente e aqui, há algumas semanas atrás, assisti às 10:00 h da manhã, a uma cena deprimente na Avenida Beira Rio. Passei por duas mulheres chorando, e logo percebi dois indivíduos evadirem com seus capacetes e moto, após praticarem um roubo à mão armada, quando elas faziam suas caminhadas em plena luz do sol. Sem nenhuma segurança próxima, ficamos todos os presentes atônitos, podendo apenas agradecer a São José, por terem levado os anéis e deixado intactos, os dedos.

Infelizmente ainda não encontramos aqui, a recíproca de São Paulo e para não me delongar mais tecendo elogios a uma e críticas a outra, volto à minha labuta, rogando aos céus e ao nosso padroeiro para que ilumine o poder público de toda a região, que um dia se chamou com tanto orgulho de região cacaueira. Antes que me perguntem o que mais eu faço aqui, que justifique tanta insistência em permanecer no nosso tão sofrido interior, eu lhes adianto que continuo fazendo amigos, pois, estes sim, são verdadeiros tesouros em qualquer lugar e acredito que não existe um local melhor para se construir a nossa família, do que o lugar em que podemos conquistar o maior número de verdadeiros amigos.