Artigo

Seca, política e sanfona

Desde o tempo do Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), o que vale dizer, desde o Governo Vargas, a União repassa verbas ao Nordeste no pico das secas. E até hoje o sertanejo continua desassistido no que lhe é mais essencial durante o flagelo: água. Tem de disputá-la, barrenta, salobra e minguada, quase reduzida a lama, com os porcos.

O semiárido baiano e de outras plagas nordestinas padece mais uma vez a reincidência da seca, prevista já no início deste século. O governante, como acaba de fazer a presidente Dilma, empunha a caneta e libera R$ 2,7 bilhões, segundo leio nos jornais. Será que parte desse dinheiro, ao menos, chegará de fato às calcinadas? Duvida-se.

A experiência ensinou que, paralelamente à seca, há uma “indústria” da seca, de natureza sociopolítica. Além dos notórios “malfeitos”, falta planejamento do que fazer e como fazer, no bojo de uma estratégia de medidas emergenciais, já que não é impossível impedir o advento da calamidade, caberá uma cesta básica de providências miúdas, mas eficazes, para minorar o sofrimento das populações.

Em comentário ilustrativo ao meu artigo de domingo passado, sobre o assunto, o engenheiro e produtor rural Paulo Cesar Bastos, antes de tudo um sertanejo orgulhoso da cidadania, concordou com a necessidade prioritária de captação e reserva de água, ao longo do ano. Sugere aterros- barragens, transformação de córregos em pequenos açudes, nas estradas vicinais, e naturalmente abertura de poços.

Vai mais além, ao evocar exemplo da Austrália: aproveitamento da capa asfáltica de estradas no semiárido, como implúvios. A água da chuva é retida e desviada para reservatórios às margens. Meio simples e engenhoso de garantir a irrigação de lavouras e famílias.

Aqui, no extenso rol dos “malfeitos”, há desvios de verbas públicas para forró junino. Bandas são pagas regiamente por prefeitos de cidades castigadas pela seca. Desta vez, o Tribunal de Contas parece atento. Veremos se conseguirá mesmo atropelar a desfaçatez do foguetório enquanto a terra racha em volta.