Artigo

“BOLSA-DITADURA”!

Segundo Rui Barbosa “um país sem memória não é apenas um país sem passado. É um país sem futuro”. Mas como “seguro morreu de velho”… Não custa exercitar a memória: os jornalistas Ziraldo Alves Pinto, o Ziraldo, aquele de “O Menino Maluquinho”, e Sérgio Jaguaribe, o Jaguar de “O Pasquim”, foram indenizados pelas perseguições impostas a eles durante o período da Ditadura Militar (1964 -1985). “O Pasquim” foi um jornal alternativo de oposição à ditadura no Brasil. Começou com uma tiragem 20 mil exemplares e no seu auge (meados dos anos 70) bateu a casa dos 200 mil. Foi um fenômeno de vendas do mercado editorial brasileiro.

Um resumo dos fatos: “A Comissão de Anistia do Ministério da Justiça já analisou 37 mil processos de pessoas que se dizem vítimas do regime militar. Julgou favoravelmente 24.600 casos e concedeu R$ 4 bilhões em indenizações. Ziraldo receberá R$ 1,2 milhão; Jaguar, R$ 1 milhão. Os dois ainda terão pensão vitalícia de R$ 4,3 mil por mês.” (Revista da Semana, 22.04.08). Tudo pago pela União, óbvio!

As indenizações de Ziraldo e Jaguar foram retroativas a 1990, antes da criação da Comissão de Anistia, em 2001. Eles se valeram do fato de serem jornalistas e deram entrada no pedido indenizatório através do Ministério do Trabalho, por meio da ABI (Associação Brasileira de Imprensa). Na ocasião foi realizada uma cerimônia na sede da ABI, no Rio de Janeiro, para a entrega do prêmio, quer dizer, da indenização, contando com a presença de várias “personalidades”. E como desgraça pouca é bobagem, entre as “personalidades” estava o assessor (que também receberá pensão de R$ 4,7 mil!) do ministro Guido Mantega, que então, para bem representar seu chefe, discursou enfático: “Quero homenagear os jornalistas que lutaram contra a ditadura”.

Orgulhoso pelo benefício recebido Ziraldo também discursou: “Aos que estão criticando, falando em bolsa-ditadura, estou me lixando; esses críticos não tiveram a coragem de botar o dedo na ferida, enquanto eu não deixei de fazer minhas charges.” E por tamanha desfaçatez foi aplaudido pelos presentes naquela ocasião! Era uma festa! Paga, como sempre, claro, com o nosso dinheiro!

Ziraldo, Jaguar e tantos outros do “Pasquim” botavam pra quebrar em cima daquela corja de militares arrogantes, presunçosos e estúpidos! “O Pasquim” era uma espécie de “chama viva da esperança”, ou “trincheira da utopia”. Para ficar ainda mais apropriado, lembrei-me de Che Guevara: “Os poderosos podem matar uma, duas, três flores, mas, jamais deterão a primavera”. Meu Deus… Era um tempo em que havia(?) causas e sonhos! Millôr Fernandes, talvez, espantado com as indenizações rechaçou: “Eu pensava que eles estavam defendendo uma ideologia, mas estavam fazendo um investimento”. Quanto mais os ditadores apertavam o cerco tanto mais “O Pasquim” respondia com artigos, charges e entrevistas incisivas, ousadas, contundentes… Claro que isso ajudava a vender muitos jornais. Por conta daquelas críticas Ziraldo e Jaguar, entre outros, foram perseguidos e presos. Era arriscado fazer e ler “O Pasquim”. Mas, era saboroso todo aquele esculacho em cima dos malditos militares… E as vendas continuavam crescendo…

Do outro lado dessa história… Em agosto de 2004 Anita Leocádia, filha do líder comunista Luis Carlos Prestes e Olga Benário, também recebeu uma indenização de R$ 100 mil… E fez dela uma doação ao Instituto do Câncer. Anita nasceu numa prisão nazista, na Alemanha, e foi impedida de trabalhar no Brasil na época da ditadura militar. Anita considerou imoral receber dinheiro por ser fiel às suas convicções. Ela só aceitou a contagem de tempo de serviço para se aposentar como professora da Universidade do Rio de Janeiro. Detalhe final: o presidente Luis Inácio, recebe R$ 5 mil, por mês, fruto dessa “Bolsa-Ditadura”…