Artigo

Ser ou não ser

“…Será mais nobre suportar na mente as flechadas da trágica fortuna, ou tomar armas contra um mar de obstáculos e, enfrentando-os, vencer?”
Hamlet, de William Shakespeare

Por favor, não leia esta coluna hoje. Estou sem inspiração, sem palavras, sem texto. Deu-me um maldito “branco.” É algo como esquecer o que se pretendia dizer no Teatro. Eu insisto, desista. Não vai dar em nada ir até o fim. Sei que, mesmo assim você vai ler. Vai ler porque quer saber como termina. E vai terminar como começou: sem dizer nada. Mesmo que o nada signifique alguma coisa – a Filosofia afirma que sim – e ele significa, certamente você vai me xingar porque leu. Leu porque quis. Ponto final.

Abrem-se se as cortinas. Terceiro sinal. O espetáculo vai começar. Que espetáculo? Fico pensando em criar um nome, um enredo, alguns personagens, um fim. Quem vai assistir? Quem vai produzir? Enrolo mais um parágrafo. Meu Deus do céu, você ainda não desistiu de ler? Que leitor insistente! Black-out. Silêncio. A plateia atenta espera os atores voltarem para o palco. As luzes continuam apagadas. Pontuação musical. As cortinas vão se abrindo lentamente

– Bravo! Bravo! Grita um espectador eufórico. Seria ele irmão de um dos atores? Qual foi mesmo o nome do espetáculo? Era um drama ou uma comédia? Alguém continua entre “as pernas”, escondida nos bastidores. A rotunda, desvelada, não guarda nenhum cenário. O ciclorama, remendado, reflete as luzes da última vara de refletores. O que dizer da bambolina, sambando na boca de cena, como se a qualquer momento fosse despencar? Peraí, a descrição deste Teatro remete a trama da peça ou a peça é apenas um adereço neste Teatro moribundo? Ele está aberto ou fechado? O Black-out foi para o espetáculo ou para o edifício?

“Ser ou não, eis a questão!” Putz. Dilema shakespereano. Chega pra lá, Hamlet! Meu Deus! “…Será mais nobre suportar na mente as flechadas da trágica fortuna, ou tomar armas contra um mar de obstáculos e, enfrentando-os, vencer? Morrer — dormir, nada mais; e dizer que pelo sono se findam as dores, como os mil abalos inerentes à carne — é a conclusão que devemos buscar. Morrer — dormir; dormir, talvez sonhar — eis o problema: pois os sonhos que vierem nesse sono de morte, uma vez livres deste invólucro mortal, fazem cismar. Esse é o motivo que prolonga a desdita desta vida.” E você ainda conseguiu chegar até aqui.