Artigo

Infidelidade e cinismo

José do Patrocínio, o Zé do Pato, líder abolicionista, lamentou que o povo desprezasse a politica até ao extremo de ignorá-la. E concluiu: “Por isso mesmo, um punhado de homens com um pouco de audácia pode triunfar, fazendo politica por ele”.

Seu diagnóstico atinge épocas passadas e presentes, com apenas uma nota dissonante: hoje, as redes sociais denunciam, desabam, convocam brasileiros às ruas; certas ONGs defendem causas nobres, recolhem assinaturas, pressionam legisladores.

Ainda assim, a consciência politica do país avança a custo. A ignorância alenta indiferença, a resignação. Os que se omitem (e são muitos, gerados pela má ou nenhuma educação) arrastam a sociedade inteira, fazendo-a engolir sapo, barbudo ou não.

Os políticos resistem a fazer uma reforma politica completa e democrática. É natural, vivem de vantagens e privilégios que, na condição de legisladores, concederam a si mesmos. A politica é a melhor carreira: dispensa diploma, é pródiga na remuneração e aposenta precocemente com os salários intactos. Ser parlamentar, ser governante, ser juiz, é ficar do lado de dentro do balcão. Ali, naquele clube vip, muitos fecham os olhos a uma virtude natural – o civismo. Dane se a galera, dane se o país, vivam os interesses pessoais nutridos pela certeza de impunidade. Fidelidade zero.

Civismo e cinismo são homógrafos quase perfeitos. O filósofo Antístenes, que era da Grécia antiga, lançou a doutrina do cinismo, que prescrevia vida simples, natural, sem o culto à riqueza e ostentação. Falava às paredes: o civismo que parecia sinônimo, murchou de modo a criar um antônimo.

É desesperador ver-se o escândalo se amiudarem no clube dos que nos governam e representam. E perceber que o amor ao país e às instituições é letra morta. Olhem o caso da Petrobrás: nasceu do sentimento nacionalista e agora, atolada em dívidas, após negócios escusos, sonegam ao povo a exposição dos cínicos que a estriparam.