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O Nobel da paz ou dinheiro?

O Premio Nobel da Paz deste ano foi dado ao chinês Liu Xiaobo, motivado pela atuação daquele professor em defesa dos direitos humanos. O Prêmio causou alvoroço dentro do governo chinês e, posteriormente, uma dura reação, quando aquele governo afirmou que a decisão do comitê do Nobel era uma “blasfêmia”.

Diplomatas chineses já vinham pressionando o Comitê a não premiar Xiaobo, alertando que aquela decisão poderia comprometer as relações entre a China e a Noruega (país que sedia o comitê organizador do Nobel). A decisão, no entanto, foi confirmada e também foi bastante comemorada por organizações que defendem os direitos humanos. Mas, e daí? Sabe-se que a esposa do professor, Liu Xia, não recebeu permissão para falar com o marido sobre o Prêmio. E de modo geral a expectativa era que aquela premiação servisse para que a comunidade internacional pressionasse o governo chinês a libertar Liu Xiaobo. Não foi o que aconteceu. Por quê?

O Ministério das Relações Exteriores da China, logo após o anúncio, vociferou: “Liu Xiaobo é um criminoso sentenciado pela Justiça chinesa por violar as leis da China. A decisão é completamente contrária ao próprio espírito do prêmio e é uma blasfêmia ao Nobel da Paz.” O anúncio em emissoras de TV foi imediatamente censurado e sites da internet que fazem a cobertura da premiação foram bloqueados. Contudo, apesar da censura, alguns apoiadores de Liu Xiaobo reuniram-se na entrada de um parque em Pequim a fim de parabenizá-lo, gritando: “Vida longa à liberdade de expressão, vida longa à democracia!”. Aqueles gritos, porém, proferidos por uma minoria corajosa, apenas causaram um pequeno estranhamento aos que passavam pelo local: a maioria das pessoas na China desconhece as razões daquela “manifestação”. Liu Xiaobo “incomoda” o governo chinês desde que aderiu aos protestos pró-democracia, na Praça da Paz Celestial, em 1989. Dois anos depois, Xiaobo foi um dos organizadores da “Carta 08”, no qual intelectuais e ativistas pediam reformas imediatas, especialmente políticas. Aquele documento inspirava-se na “Carta 77”, outro movimento pró-democracia na Tchecoslováquia durante a década 1970. Publicado o documento, imediatamente, Xiaobo, foi “julgado” e condenado a 11 anos de prisão sob a acusação de subversão, por fazer campanha em prol de liberdades políticas.

O advogado de Liu Xiaobo, disse esperar que, “graças a essa decisão (o dissidente ter sido escolhido para o Prêmio Nobel da Paz de 2010), ele seja liberado rapidamente, embora ainda seja muito cedo para se saber se será assim mesmo”. E acrescentou:
“Espero que nesta ocasião, a China se abra ainda mais, que se levantem as restrições à liberdade de expressão”.

O Estado chinês controla com “mãos de ferro” a economia: são megaestatais que investem bilhões de dólares no exterior, inclusive no Brasil. Essas empresas também compram bilhões de dólares de produtos de outros países, como aviões, máquinas e equipamentos de tecnologia (dos Estados Unidos e mais uma vez do Brasil). Isso dá à China um enorme poder de chantagear economicamente seus parceiros comerciais, em defesa daquilo que eles chamam de seus interesses políticos. Uma das “vítimas” da retaliação da China contra a Noruega, por exemplo, pode ser a compra de 40% de um campo de petróleo no Brasil explorado pela estatal norueguesa Stateoil. O negócio de US$ 3 bilhões foi anunciado em maio pela estatal chinesa Sinochem. Agora, corre o risco de ser cancelado no pacote de reação ao Nobel. Pronto. Penso que ficou claro as razões pelas quais nem os Estados Unidos, nem o Brasil (apenas para citar dos grandes países) não se pronunciaram em defesa da “democracia e dos direitos humanos”: melhor um professor preso do que dinheiro perdido.

Nobel da Paz, da Física, da Literatura, pra quê? Dever-se-ia manter apenas o Nobel da Economia…