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O susto do senador

Senhor! Senhor! Com licença. Dize-lhe o assessor de imprensa: está no horário de irmos à convenção na sede do Partido. Claro, respondeu-lhe o senador Armando Pontes. Deixe-me só revisar alguns pontos do discurso que farei quando da apresentação formal de meu nome ao partido. Ok! Respondeu-lhe o assessor José Aguiar Cordeiro, mais conhecido por “Pastor”. Era um profissional respeitado.

Enquanto o senador fazia uma breve revisão, Pastor foi à estante e pegou materiais que achava ser úteis ao evento. O escritório particular do senador ficava em sua própria casa, localizada em frente ao mar. Era um espaço considerável. Na sala de reuniões passaram vários políticos, inclusive o próprio Presidente da República. Vários quadros de artistas renomados decoravam o ambiente. Sofás e poltronas importadas combinavam com os tapetes persas espalhados. Numa mesa de canto ficavam expostas bebidas finas, de champanhes francesas ao legítimo Scotch.

Alguns minutos se passaram. O senador chamou a secretária, o assessor e pediu para Jonas, o motorista, para preparar o carro. Saíram com destino à sede do Partido. D. Tereza, sua mulher, ficou em casa organizando um coquetel que seria oferecido aos correligionários após o evento.

No trajeto, o senador questionou ao seu assessor se a situação estava mesmo tranquila, no sentido de que o seu nome seria indicado para o governo do Estado, obtendo resposta positiva. Pastor, entretanto, fez a ressalva de que havia um movimento capitaneado pelo Deputado Souza Pinto, seu adversário politico e que também pretendia a indicação do Partido, mas era coisa sem importância. E a viagem prosseguiu.

Já na sede do Partido, uma multidão o aguardava. A imprensa em peso se fazia presente. O palco devidamente ornamentado. Iniciou-se a solenidade. Concedida foi a palavra ao Senador para apresentar suas propostas, plano de governo, etc.… Começou ele o seu discurso. Eloquente, falava inflamado. Tinha o poder persuasão. Em meio a sua fala, o seu desafeto, de inopino, tomou-lhe a palavra e disse: Vossa Excelência é um mentiroso. Um dissimulado. Um traidor do povo. Vossa Excelência não tem condições de ser nada, nadica de nada. O seu lugar é na cadeia e não no governo. No governo não é lugar para assassino e ladrão. Vossa Excelência matou o seu sogro, o coronel Tibúrcio Pedrosa para ficar com as fazendas de cacau, gado e café pertencentes a ele. E não adianta negar, porque o Coronel se encontra aqui. Como pode? Pensou consigo. Aquele infeliz está morto.

De repente, eis que surge o Coronel Tibúrcio em pessoa, digo, em alma e, na qualidade de vítima e de testemunha, confirma que foi realmente assassinado pelo senador numa emboscada na cancela da fazenda Esmeralda. O Senador ficou afônico, só gesticulava. A multidão começou a vaiá-lo. Ele suava igual a cuscuz e uma catinga desgraçada empesteava o ar. E mais, em edição especial, naquele mesmo instante, saiu na televisão a notícia do envolvimento do mesmo na CPI da Tapoioca, um escândalo de proporções tsunâmicas. Agentes da Policia Federal chegaram com um mandado de prisão preventiva por conta de desvio de dinheiro público quando prefeito municipal. O mundo parecia cair, desabar e nada podia ele fazer… E a angustia só aumentava. Teve vontade de gritar, mas não tinha voz; de correr, mas não tinha pernas; de se esconder, mas aonde? Onde estava Jonas? Onde estava Pastor? A Secretaria também sumiu. Estava perdido… Debatendo-se, acorda com a mulher lhe sacudindo… Filho, pergunta ela, que houve? Você está molhado, sujo. Ele respondeu: nunca mais faça buchada de bode para o almoço.