Artigo

O Agiota

Um agiota morre e vai para o inferno. Leva muitos cheques sem provisão de fundos e notas promissórias vencidas. Chegando lá. Procura localizar os seus devedores que o precederam; não os encontra. Só vê por lá os seus concorrentes daqui da terra. Todos agiotas estavam, como ele, nos quintos dos infernos.

Precisa telefonar. A ligação do Inferno era muito cara; do Céu, 0800. Como é que, para cobrar a um velhaco, teria que gastar tanto dinheiro? – interroga-se. De repente, recebe uma ligação 0800:

– Alô, é o agiota Assis Bombão?
– Fala! Quem é você?
– Eu sou patanjali!
– Procurei você aqui e não lhe encontrei!

Quando é que você vem para cá?

– Por acaso eu já pratiquei agiotagem?
– Mas quem lhe disse que velhaco vai para o Céu?
– Lembre-se de que morri e se não estou no inferno é porque Deus me perdoou.
– Como Deus se atreve a fazer isso, se ele não me pagou a sua divida para, na condição de seu novo credor, poder ter lhe dado o perdão?
– Lembre-se também que você me deixou na miséria. Não pude nem pagar o meu caixão.
– Velhaco como você merece, no máximo, ser enterrado num saco plástico!
– Engano seu. Tive um sepultamento chic, com velório, urna funerária, flores, mirra e muitas lágrimas.
– Já sei que foi tudo por conta do SAF.
– Não. Foi comprado mesmo.
– À vista?
– A prazo!
– Duvido, hoje não se vende fiado sem consultar os Serviços de Proteção ao Crédito.
– Por acaso, agiota pode botar alguém no SPC e no SERASA?
– Não. Se eu pudesse fazê-lo, já teria botado um velhaco como você naquele rol de inadimplente!
– Você não pode me colocar no SERASA, mas pode me emprestar R$50.000,00.
– Prá que você quer tanto dinheiro assim?
– Prá pagar o meu funeral.
– O problema é meu ou de quem lhe vendeu fiado?
– O problema é nosso!
– Nosso? Por quê?
– Você sabe quem é a avalista?
– Quem? Diga-me, eu não sou adivinho.
– A viúva.
– A viúva minha mãe já morreu.
– A viúva…
– A viúva de quem?
– A viúva… sua mulher!