Entrevista

Entrevista com Ophir Cavalcante –Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

Jornal Direitos – Este ano a Justiça brasileira tomou decisões tidas como simbólicas, com a constitucionalidade da Ficha Limpa e a manutenção do poder de investigação do CNJ. São novos ventos que sopram no judiciário brasileiro?

Ophir Cavalcante – Se pudermos delimitar um marco, este seria, sem dúvida, o da edição da Constituição de 1988, e mais ainda com a reforma do judiciário ocorrida em 2005, cujo efeito maior foi promover uma maior transparência do judiciário. Foi daí que nasceu o Conselho Nacional de Justiça. O certo é que vivemos hoje em um ambiente de indiscutível liberdade democrática, mas essa conquista só não basta se não zelarmos por este conceito e permitirmos retrocessos. Esta foi a preocupação que serviu de combustível, por exemplo, para a OAB defender o poder de investigação do CNJ, evitando que alguns setores, ainda com o pé no passado, insistissem em um judiciário encastelado em torres de marfim, distante da sociedade. Isto, efetivamente, está mudando.

JD – Como o senhor vê o momento atual do Brasil? O que falta para o país ter instituições mais sólidas e respeitadas?

OC – O Brasil está diante do desafio de deixar a periferia do mundo para ingressar, finalmente, no círculo das nações desenvolvidas. Mais há muito a fazer para corrigir as desigualdades construídas por séculos de atraso, seja atraso de mentalidade, atraso de política, atraso de humanidade, atraso de vontade. Já que estamos em ano eleitoral, não podemos deixar de fazer na reforma política, que contribuiria para fortalecer os partidos políticos, os quais, de eleição em eleição, perdem seus representantes em razão de insatisfação do eleitor com o desempenho do seu candidato. A reforma política está na agenda nacional desde 1930, quando se falou pela primeira vez em sanear o processo eleitoral. Porque não sai? Creio que seja o atraso de vontade, a que me referi. Se tivéssemos maior visibilidade das legendas e do quadro partidário, talvez tivéssemos outra configuração nessa questão. Não teríamos, quem sabe, o famigerado “caixa dois” financiando campanhas sem nenhum compromisso social.

JD – A corrupção é um dos temas que a OAB tem se mantido vigilante. A entidade chegou, recentemente, a exigir a cassação do senador Demóstenes Torres, Como Combatê-la?

OC – A mobilização social é o melhor antídoto para esse mal. A corrupção escancarada todos os dias na mídia continua a indignar e revoltar os cidadãos honestos. São estas as pessoas que devemos mobilizar, pois estas pessoas, felizmente, são a maioria. O efetivo controle da administração pública é uma obra inacabada. E tudo converge para um ponto: o acesso à informação. Pois o controle da legalidade do governo, seja em que esfera for por si só não basta. A sociedade não apenas quer saber se os recursos públicos foram geridos conforme a lei, mas principalmente se foram empregados da melhor maneira possível, maximizando o custo-benefício e atendendo aos seus anseios.

JD – Depois de muitos anos, o Congresso finalmente trabalha na reformulação do Código de Processo Civil e de Processo Penal. Quais mudanças a OAB espera que venham com as reformas?

OC – Temos acompanhado a tramitação dos códigos. Devo destacar que muitos projetos de lei que estavam em fase avançada para a aprovação, dentre os quais o da vedação da compensação de honorários advocatícios, tiveram que ser apensados aos projetos do CPC e CPP em curso, o que nos remete, agora, a uma nova etapa de trabalho no sentido de não permitir a inclusão de dispositivos que impliquem em prejuízo para o advogado.

JD – Como o senhor vê o ensino do direito no Brasil hoje?

OC – O ensino jurídico não qualificado compromete a formação dos operadores do direito. Um advogado preparado é sinônimo de uma justiça melhor. Mas temos de reconhecer que com mais de mil cursos de direito em funcionamento, muitos deles sem nenhuma preparação, esta sonhada qualidade ainda está longe. Infelizmente, muitas dessas instituições continuam a cometer um verdadeiro estelionato educacional. Há muito a OAB exige um basta a esse mercantilismo. Mas não estou generalizando, porque há as exceções.